Caldeirão e "A Cidade do Paraíso"
Na História do Brasil e do mundo, muitos são os exemplos de movimentos religiosos que tiveram um final trágico. Líderes e fiéis de vários desses movimentos morreram vítimas de repressão governamental, de sacrifícios efetuados em rituais ou suicídios e imolações coletivas. Alguns dos casos mais marcantes e conhecidos da História do Brasil são os de Canudos (1893-1897), no interior da Bahia e do Contestado (1912-1916), em Santa Catarina. No entanto, muitas outras são as situações em que a fé do povo e liderança carismática de um beato, pastor ou pregador levou centenas de pessoas a participarem de um projeto de construção de uma sociedade diferente e por assim dizer alternativa.
No sertão nordestino do final do século XIX e início do século XX, fatores como o mandonismo, o coronelismo e as constantes secas foram elementos que contribuíram para a ampliação do número de excluídos e que se tornam elementos constitutivos do surgimento de bandos armados (os cangaceiros) e do surgimento de líderes religiosos com uma pregação de salvação e de mudança de vida (Messianismo).
Entre as décadas de 20 e 40 do século XX, na região do Cariri Cearense, mais precisamente na Chapada do Araripe, surge a figura do Beato José Lourenço; um devoto do Padre Cícero que teria sido enviado por este com a missão de acolher os fiéis que chegavam constantemente a Juazeiro.
Na fazenda Caldeirão da Santa Cruz, o Beato instituiu uma comunidade com o modo de vida austero. O centro da vida eram as celebrações religiosas, as rezas dirigidas por José Lourenço e o trabalho, com a maioria das pessoas se dedicando à agricultura. A comunidade levava uma vida igualitária e todos podiam trabalhar a terra. Os bens produzidos eram partilhados entre todos. O trabalho era visto como um meio de salvação e as regras eram rígidas. Com a morte do Padre Cícero, o número de fiéis que acorreram para Caldeirão aumentou significativamente, fato que chamou a atenção das autoridades para a fazenda, o Beato e suas atividades.
Entre 1936-37, o Caldeirão atingia o ponto máximo de sua existência e a comunidade preparava a construção de uma igreja, uma melhor distribuição das moradias (com a abertura e organização de ruas) e também a formação de uma escola de educação básica, que seria possível com a chegada de três professoras.
A Campanha contra o Caldeirão e o Beato José Lourenço
No mesmo período a campanha difamatória contra o Beato e a comunidade ocupou mais espaço na imprensa do Ceará como se pode ver nesta nota do Jornal o Povo:
"Usam os penitentes do beato José Lourenço, sem exceção, homens, mulheres e crianças, ordinária roupa preta, tinta com lama, que exala insuportável mau cheiro. Quase todos possuem uma espingarda de caça e garrunchas e alguns revólveres...
Não é possível ocultar o perigo que acomete este ajuntamento selvagem em lugar deserto e despoliciado como a Serra do Araripe, não sendo de estranhar que dentro em breve surjam roubos e tropelias outras praticadas por aquele bando de inconscientes de quase mil indivíduos, atualmente vagabundos e ociosos. Por isto julgamos prestar grande serviço à nossa terra dando notícia dentro das fronteiras do nosso município desse cancro social... (O Povo, 12-05-1937 In: Cordeiro, 2008).
Atualidade
- http://historia.abril.com.br/religiao/comunidades-messianicas-outras-canudos-433698shtml
- http://www.continentemulticultural.com.br/index.php?view=article&catid=133%Amessian...
- http://lucasparente.blogspot.com/2007_06_01_archive.html
- http://professorfreireneto.blogspot.com/2008_06_01_archive.html
- http://auribertoeternochocalheiro.blogspot.com/2010/01/caldeirao-e-pau-de-colher-historia-das.html
- NEGRÃO. Lísias Nogueira. Revisitando o Messianismo no Brasil e profetizando seu futuro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol 16 nº 46 . Junho de 2001.
- CORDEIRO. Domingos Sávio de Almeida. Caldeirão da Santa Cruz: Memórias de uma utopia comunista no Nordeste Brasileiro. VI Congresso Português de Sociologia. Universidade Nova Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, 2008.